Temas e Controvérsias

MENTORIA: PROFS TRATADOS COMO CRIANÇAS…E OS ALUNOS..?!

(Um referencial equivocado e alguns erros sérios decorrentes)
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Mentoria i
Em tempo de ‘coachs e coxinhas’, melhor não imitar!

Em reunião do nosso Depart. de Psiquiatria (12/9) foi apresentada a DETERMINAÇÃO da CEG/CEPEG—a partir de sugestão da Congregação—de que TODOS os profs exerçam MENTORIA sobre um certo número de alunos. Segundo o colega que apresentou a novidade, essa atividade vem sendo tentada há mais de dez anos, sem sucesso. A adesão teria sido mínima nesse período e insuficiente, segundo sua avaliação. Antes de tudo havia que apresentar o PRINCÍPIO que a norteia e eu, antes de começar minha crítica expus aquilo que entendia como objetivo: que nenhum aluno fique sem ter uma referência mais específica entre os professores, a quem possa recorrer em função de orientações e necessidades  diversas. Tendo o colega aceitado minha impressão, passei à crítica do processo de decisão que nos foi apresentado…PRONTO. Não vou discutir intenções, pois NÃO bastam para que administrações e gestões tenham algum sucesso.

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QUEM NÃO O EXERCE NATURALMENTE….NÃO O FARÁ POR ORDEM
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Como disse nosso colega Jorge Adelino: “O que mais fiz na vida acadêmica, ao lado das atividades específicas,  foi esse tipo de acolhimento”. Tudo indica que—seja agora, pelo não cumprimento da ordem; ou depois, pelo fracasso do empreendimento artificialmente exercido—estamos diante de um  esforço malfadado. A verificar. Mas há muitas outras consequências nada edificantes associadas: em tempos de AUTORITARISMO explícito, não estaríamos sendo tratados como escolares?
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QUE PASSIVIDADE É ESSA DOS PROFESSORES?
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Não teriam os colegas RAZÕES fortes para opor resistência, ainda que passiva? E é aqui que não posso me solidarizar com seu silêncio. O que está se passando com os colegas? Fingem que o problema não é com eles e não saem a campo, expondo-se para defender o que pensam… POR QUE SE CALAM DESSA FORMA? Eu, como não gosto de ARTIFÍCIOS e, além disso, não considero que TODOS os alunos precisam desse tipo de INTERVENÇÃO, não me sentiria muito à vontade para esse exercício FORMALIZADO. Até porque e quando aluno, duvido muito que recorresse a esse tipo de orientação. Quem gosta da independência e do juízo crítico livre estimula seu exercício para com todos, ou seja: NÃO SEGUE NEM QUER SEGUIDORES, especialmente os mais submissos. Mas estou disposto a rever essas impressões, a partir de resultados e não de “lenga lenga” verborrágica.
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"Pior é achar que alguém sabe todos os caminhos"
“Pior é achar que alguém sabe todos os caminhos”

UM ARTIFÍCIO E ALGUNS ERROS DECORRENTES!

Apontado o artifício, vamos às suas consequências:
1- O colega reconheceu que nem todos os profs exerceriam a atividade. E então estamos diante de algo que DESMORALIZA as “elites” brasileiras através dos tempos: as ordens que viram “letra morta”! No caso, com um agravante, pois admitido na origem e pelo defensor do projeto. Todos sabem: há um efeito de contágio nessas decisões, especialmente quando SEM LASTRO ou PRINCÍPIO. Um colega não o faz e os outros também não o fazem. Convenhamos: não precisamos de mais essa DESMORALIZAÇÃO.
2- perguntei-lhe qual a SANÇÃO prevista e associada à ORDEM? Que PUNIÇÃO (sem aspas) era prevista para quem não a cumprisse? Afinal, é um bom PRINCÍPIO: toda ORDEM emanada de uma AUTORIDADE tem que ser associada a uma SANÇÃO. Qualquer coisa diferente disso funcionaria como uma “mordida de banguela”. O resultado? Mais desmoralização: dos autores da ordem e dos professores em geral. Quem administra alguma coisa deveria saber e aplicar esses princípios, sob pena de sua própria… desmoralização.
3- “Então vamos discutir isso na Congregação para decidir qual a sanção”, foi sua frase. Confesso que não sei o que é pior nisso tudo: se a fragilidade da ordem em geral, ou se o acatar minha sugestão com tanta facilidade. Uma coisa é certa: não percebo ali disposição para refletir profundamente sobre o efeito daquelas ideias na vida real e vice-versa.
4- Sanções não previstas em contrato de trabalho e/ou LEGISLAÇÃO são ilegais. Logo, e como disse acima, é mesmo mordida de banguela.
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SE O ESPÍRITO FOSSE OUTRO…ACOLHEDOR E NÃO AMEAÇADOR!
Acho até que seria fácil obter resultados; se fossem bons, seria gerado um círculo virtuoso: as coisas melhorariam progressivamente e sem causar traumas. Bastava, em vez de ameaças e desmoralização generalizada, oferecer algum benefício aos que aceitassem. E eles estão ali, ao alcance da mão. Que o exercício de uma mentoria pesasse nas progressões funcionais. Bastaria que fossem apresentados relatórios anuais dos quais constassem: número total de alunos “assistidos”; número de situações específicas abordadas (talvez com “relato de caso”, evitando o viés médico/psicológico e sempre cuidando para preservar sigilo); número de reuniões realizadas (com ATAS redigidas, se possível) e outras. Situações mais extremas deveriam ser levadas a um grupo maior. Tudo isso com a ESPERANÇA de que o processo também servisse para atuação contra eventuais atitudes reprováveis por parte de colegas, incompetência, descaso…
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PROFESSORES PRECISAM COMEÇAR A APRENDER COM OS ALUNOS!
Por fim, vou ser um pouco indelicado: “Nada se muda verdadeiramente sem causar alguma dor”. Eu que estou na UFRJ desde 1971; que fui representante e orador de turma (1976), fico um tanto desanimado quando vejo a trajetória da maioria dos meus colegas de turma: outrora envolvidos (em diferentes níveis) na luta contra a ditadura, hoje defendendo todo tipo de arbitrariedade. É impressionante como tantos apoiam o autoritarismo vigente; como abraçaram as causas mais retrógradas; como se deixaram levar por um certo “narcisismo médico”, julgando-se seres muitos especiais e ACIMA dos demais. Vejam que deixei de lado as posições vergonhosas de nossas entidades. Na outra ponta, continuo a receber turmas tão boas, dedicadas e solidárias! FICA A PERGUNTA: Que processo é esse que vai triturando o juízo crítico dos médicos? Uma coisa é certa: nenhuma profissão é tão marcada pela tendência à “dinastia”: quase todos são filhos, netos, sobrinhos…de médicos. Assim, há também uma tendência à SUBMISSÃO aos mais velhos e é isso que precisa ser criticado e SUPERADO. Quando ouço um velho dizendo (ou sugerindo de diversas formas): “No meu tempo é que era bom!”, pergunto: “Se v. pegou um mundo melhor e o entregou pior…de quem é a responsabilidade?”. É hora da juventude assumir seu papel histórico, especialmente na MEDICINA, não deixando que se corrompam seus valores. Quem sabe REAPRESENTÁ-LOS aos que não mais os reconhecem ou até se reconhecem. A psicanálise ajudou a desacreditar os pais e líderes religiosos. Como o ser humano adora ser conduzido, surgiram os “coachs” e (quem sabe?) mentores. Nesse tipo de relação, só acredito em via de mão dupla. Caso contrário, seu resultado será perverso.
Vice- Diretor do Instituto de Psiquiatria da UFRJ