Arte e Cultura

A FIFA A SEUS “FOFINHOS”: DICAS RIDÍCULAS!

(“TENHAM CUIDADO: Vão entrar em contato com animais não domesticados!”)

Márcio Amaral

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NOTA: muitos brasileiros ficaram ofendidos com o teor dessas “Dicas da FIFA”. Eu, se fosse do H. Norte, ficaria bem mais ofendido. Afinal, quem é a FIFA para lhes dar aulas de “como se comportar”? Delegaram-lhe esse poder para falar assim e por todos eles? Bem…há quem acredite em “dicas inocentes e despretensiosas”! Para mim é reafirmação de poder sobre mentes não muito livres. Seriam, as pessoas que virão à Copa, tão infantis como a FIFA os pintou: “OS FOFINHOS DA FIFA“? Vi, na minha infância, uns pequenos tapetes, que se colocavam na entrada das casas, tendo escrito em cima: “Seja Bem vindo, mas limpe os pés!“. Eram horríveis! Já eu, diria aos Europeus e norte-americanos: “Sejam Bem vindos e sujem um pouquinho seus pés!“. A vida pode ser bem melhor, E SERÁ—não é mesmo Gonzaguinha?— especialmente quando nos libertarmos dessas “Organizações” que não cansam de tentar colocar cabresto nos seres humanos.

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Diante das “Dicas da FIFA para um Turista em visita ao Brasil” não posso deixar de exagerar! Sei que já sou um tanto exagerado, mas vou me ultrapassar! Afinal, havia ali um anacrônico “eurocentrismo cultural” e uma indisfarçável mistura de interesse e crítica para com os brasileiros. Não posso perder a oportunidade de tentar fazer um contraponto, bem humorado e cáustico, em relação àquelas “Dicas”, uma vez que conheço um pouco da intimidade de muitos europeus (de várias nacionalidades) e posso perceber o quanto perderam de graça, espontaneidade, dança, sensualidade…tentando se tornar alguma coisa que lhes disseram que teriam que ser. Pobres homens excessivamente civilizados! Pois bem: onde eles sugerem uma crítica, vou tentar demonstrar a existência de UM VALOR MUITO HUMANO PELO QUAL NÓS BRASILEIROS LUTAMOS ATÉ INCONSCIENTEMENTE! Acho que tenho alguma “autoridade” para falar no assunto, uma vez que sei valorizar muito algumas das características que os europeus costumam elogiar: pontualidade, assiduidade, organização, espírito público (mais para os escandinavos) e outros. Apenas acho que eles ficaram aprisionados demais ao medo da inconveniência e do ridículo. Afinal, as melhores coisas da vida passam pelo risco de ser inconveniente e/ou…cair no ridículo. Não discuti todas e os grifos serão todos meus.

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1 – Sim não significa sempre sim (para os brasileiros): é a entonação da voz que define se o sim é realmente um sim, ou um talvez. Por isso, “não espere o telefone tocar nos próximos cinco minutos” se um brasileiro dizer (disser, corrigindo): “te ligo na sequência”.

Que beleza essa palavra “ENTONAÇÃO” por eles aplicada! É mesmo muito brasileiro! É na PROSÓDIA que se expressam os afetos e as verdades das pessoas. E nós somos mesmo bons de prosódia. Com certeza, na promessa de ligar de volta, havia uma intenção inicial, mas ela poderia apenas não ter muita consistência. A verdade dos SENTIMENTOS se impôs. Não está afastada também a possibilidade de haver muitos europeus sofrendo por demais de traços de “Evitação” e/ou fobia social: sofrem tanto com uma decepção nas relações humanas, que qualquer adiamento é percebido como “Não gosta de mim…”. Sejamos menos catastróficos! Bem pior talvez seja cumprir uma obrigação indesejada, terminando por expressar o mal estar de outras formas.

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2 – O tempo é flexível: não espere que o brasileiro seja pontual. “Se duas pessoas marcam de se encontrar às 12h30, elas vão se ver a partir das 12h45”.

Até que eles foram bem condescendentes! Eu, que sofro do “mal da pontualidade extrema” sei que esses prazos tendem a ser bem mais elásticos entre nós…especialmente quando se tratam de festas. Sou sempre o primeiro a chegar. Brinco dizendo ser essa uma virtude muito pouco reconhecida no Brasil, pois nunca há uma testemunha sequer para certificar sua chegada na hora. “TEMPO ELÁSTICO“! Que bobagem! Gostaria de saber o que Leibniz e Einstein diriam disso. Pois se o espaço é curvo e o tempo….sempre elástico, sem falar que os dois simplesmente não existem como “coisas em si”, contrariamente ao que dizia o muito inglês Newton. Sei o quanto os suecos sofrem só pela possibilidade de se atrasar por alguns poucos minutos. Isso é desumano! Passei a não cobrar de outros a mesma pontualidade: sempre começo as sessões que presido dez minutos depois. É um respeito à dimensão humana que as coisas precisam ter.

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3 – Contato corporal: brasileiros não estão acostumados com o jeito dos europeus de se manter educadamente uma distância entre um e outro. Eles falam usando as mãos e não vão hesitar em tocar na pessoa com quem estão falando.

Repararam nos olhos assustados do "FOFINHO desgarrado que voltou pro colo da mamãe"? É a versão dinamarquesa de "O MOITA". Acho bom procurar outra profissão. Quem sabe escrever sobre moda ou culinária francesas?
Repararam nos olhos assustados do “FOFINHO desgarrado que voltou pro colo da mamãe”? É a versão dinamarquesa de “O MOITA”. Acho bom procurar outra profissão. Quem sabe escrever sobre moda ou culinária francesas?

Esssa foi demais mesmo! Poucas vezes vi um exemplo tão bom de como uma DEFICIÊNCIA pode passar a ser tratada como um VALOR. A palavra “EDUCADAMENTE” soou até ridícula nesse contexto. Quem sabe POLIDAMENTE…como um punhal!? Há mesmo muita gente que confunde educação com etiqueta e protocolo. Educação, para mim, é totalmente associada ao respeito às pessoas, especialmente aquelas em situação de submissão, além de um esforço de compreensão e interação afetiva, para além dos PROTOCOLOS. E isso, por aqui, implica um sentimento de que o contato humano (desses mamíferos que somos) há de ser bom! Há que romper alguns protocolos que amarraram os seres humanos: “cada qual no seu quadrado”—“…E cada qual no seu canto/Em cada canto uma dor…“. Conheci pessoas que iam a médico, pois somente assim teriam contato físico com seus semelhantes. O DESERTO INDIVIDUAL E COLETIVO de que falou H. Arendt atingiu mesmo os europeus. Sentença de M. Thatcher: “Sociedade? Isso não existe! O que há são indivíduos!“. Já em relação à ETIQUETA, não somos mesmo muito bons nas suas regras. Mas na sensibilidade para com o outro…!!!

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4 – Filas: Esperar pacientemente numa fila não está no DNA dos brasileiros, que preferem cultivar o caos.

Já aqui eles exageraram! A palavra CAOS decididamente não caberia. Foi mais uma expressão do seu catastrofismo: “Fora da ordem…só resta o caos!”. Aliás, qualquer ordem precisa se fazer em função de PRINCÍPIOS, valores e interesses muito humanos. Os nazistas aplicaram uma ordem enorme, industrial mesmo, na execução dos judeus. Os japoneses também adoravam esse tipo de ordem antihumana. Até na nossa bandeira está lá: “ORDEM E PROGRESSO“, como se a ordem, em si e necessariamente, levasse ao progresso. Ela também pode levar ao CAOS…ao pior de todos os CAOS! Uma pequena história: sempre que vou à Suécia, canto em alguns coros de Igreja. Nos intervalos dos ensaios, há um muito simpático e agradável café com alguns variados bolos e biscoitos. Ao seu final, invariavelmente se forma uma fila de senhores e senhoras diante da pia, cada um com sua xícara na mão, esperando por sua vez de lavá-la. Um dia, como eu ficasse esperando sentado pela minha vez, uma das simpáticas senhoras fez esse mesmo comentário a respeito dos brasileiros não ficarem em fila (sorrindo, é claro). Respondi que não tinha nada contra filas, mas que nada me obrigava a ficar ali em pé, pois podia esperar sentado até que todos acabassem. Além disso, seria bem melhor se houvesse um rodízio na lavagem evitando aquela situação de dezenas de velhos em fila (nem prioridade ali podia haver). Mas o mais delicado não é isso e eu não o disse para não ferir. Dei-me conta de haver ali uma necessidade de demonstrar: “OLHEM COMO EU SOU EDUCADO; COMO ME COMPORTO BEM E SEI ESPERAR EM FILAS“. É a isso que chamo uma perda sutil da liberdade!

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6 – Controle-se: se você vai a um restaurante de churrasco em que você pode comer à vontade e quer imediatamente pegar o menu de carnes, lembre duas coisas: não comer pelo menos 12 horas antes da refeição e consumir em pequenas doses, pois a melhor carne é servida geralmente por último.
Essa…me desculpem, mas ficou mal foi para os próprios europeus! Não parece “dica” dirigida a pessoas educadas, pois sugere: “Façam como os donos de cães: alimentem-se apenas uma vez por dia”. Talvez sintam que, sob o verniz da sua polidez existe um animal faminto e violento! Certo dia, andando de bicicleta em Copacabana, vi um grupo que (pela vermelhidão da pele e violência no gestual) parecia de ingleses, atirando para o alto pequenas garrafas de plástico e gargalhando. Parei e perguntei se na terra deles faziam o mesmo. Achavam que, por aqui, valia tudo. Que educação é essa que, na falta da repressão direta, desaparece sem deixar rastro? A mim só me interessam os valores verdadeiramente entranhados em mim e nas pessoas…aqueles que são nossos de verdade e vão conosco por toda parte. O resto é HIPOCRISIA!

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9 – Sem espanhol: o idioma nacional é o português. Se você falar que Buenos Aires é a capital do Brasil você pode ser deportado.

Que venha o Espanhol (nós temos sido os deportados de lá)! Quem sabe o alemão e o russo?! Vivam: Buenos Aires e os Argentinos que amam o Brasil! Venham! Faremos sempre um enorme esforço para entender e ajudar, especialmente aos turistas. Não transfiram para nós a sua impaciência para com os que não sabem o idioma do seu país. Ficamos tão orgulhosos quando vemos um estrangeiro arranhando um pouquinho de nosso doce e suave português! Não somos bons em deportação! Quando deportamos alguns espnhóis em represália, eu me ofendi! Já repararam que ninguém sabe o Imperativo dos verbos entre nós brasileiros? É que nunca o empregamos. Começamos sempre por “Daria prá v…?”; “Será que é possível…?”. Lembram da nossa prosódia? É a nossa alma.

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10 – Tenha paciência: no Brasil, as coisas são feitas nos últimos minutos. Isso vale até para os estádios. E se tem uma coisa acima de todas que um turista deve se lembrar, é não perder a paciência e segurar os nervos. Uma atitude brasileira para resumir isso é: relaxa e aproveita.

Antes de tudo, e em tempos de VEXAME DO IPEA, foi de muito mau gosto usar uma expressão associada ao estupro! Se há um ditado que considero totalmente tolo é o “Não deixe para amanhã…”. Aprendi com os suecos, especialmente em relação a reformas em casa e coisas dispendiosas, que bem melhor é o: “Só faça hoje aquilo que for absolutamente imprescindível! O resto, você vai fazer muito melhor depois“. Diga-se de passagem, isso vale somente para as tarefas. Já para com o amor e outras das grandes expressões humanas eu afirmo junto com o nosso compositor Roberto Ribeiro: “Tem que ser agora ou nunca mais!/Deixar prá amanhã por que,/Se hoje há tempo de mais?/Talvez amanhã eu não possa voltar/Ou quem sabe você mesma/não irá mais me aceitar…” Muito humildemente, essa canção me inspirou outra, uma espécie de resposta feminina:

JÁ É, E SÓ SE FOR AGORA

……
Já é, e só se for agora,
Preciso lhe entregar o meu amor.
Já é, e só se for agora
Vou com você seja lá para onde for.
Já é e só se for agora
Pensando bem, eu acho até que demorou.

Eu quero expressar meus sentimentos
Sem vacilação ou subterfúgio;
Sequer pensar em dor ou arrependimento
Saltar de vez e escapar desse refúgio.

Hei de mostrar aqui mesmo e nessa cara
Tudo aquilo que me vai no coração!
Deixar fluir essa energia que não pára
Sentir minha vida pulsando na palma da mão.

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