Arte e Cultura

LONDRES: O SUICÍDIO DA ENFERMEIRA!

(Mais uma Consequência de Mistérios Tolos e Terrorismo de Estado)

Márcio Amaral

O mundo ficou surpreso  com o pretenso suicídio da enfermeira que, por ingenuidade e excesso de zelo, deixou-se enganar por um “trote” telefônico feito, facilitando o fornecimento de informações—tratadas como SEGREDOS DE ESTADO—sobre a família Real inglesa. A desproporção foi estarrecedora. Os próprios radialistas, ainda impactados com o acontecimento, disseram que tinham certeza de que seriam identificados, até por seu forte sotaque australiano. Discutir a culpa (ou não) dos radialistas seria perder o verdadeiro foco da questão. O que vai me interessar é: que tipo de atmosfera foi criada em torno do fato (antes, durante e depois das revelações) a ponto de levar alguém à situação extrema de tirar a própria vida somente por uma revelação de algo público e de interesse público Afinal, quem paga as despesas reais?

Inculpar os radialistas seria o mesmo que, depois da explosão de um ambiente cheio de gas de cozinha (por algum vazamento irresponsável), inculpar a pessoa que, por inadvertência, acendesse um fósforo na escuridão para verificar o que estava acontecendo.O ambiente era “tóxico”. Isso é o que deve interessar.

Considerando, que a enfermeira nem fazia parte dos grupos de maior risco para o suicídio: mulher, casada, com 2 filhos, de origem indiana, sem história prévia de depressão, uso de drogas, transt. da personalidade tipo “Borderline” e outras, o suicídio  deveria ser tratado, em princípio, como muito suspeito*. Que informações tenho para fazer essas últimas afirmações? “Elementar, meu caro W…”. Sua vida foi, certamente, investigada até os últimos detalhes. Nessas coisas, a Scotland Yard é boa.

Pessoas que pesquisam o suicídio sabem que, especialmente de maneira aguda, o sentimento de vergonha (ao lado do sentimento de desesperança, esse de efeito mais crônico) é o mais associado a uma ação extremada como aquela e, em um rompante, seria mesmo possível um desfecho como aquele. Daí à SYard dizer que a morte não estava sendo tratada como suspeita, vai uma enorme distância. NÃO PODIAM TER FEITO ESSA AFIRMAÇÃO, ANTES DE UMA INVESTIGAÇÃO. A conduta recente daquele órgão policial, aliás, tem dado razões para muitas suspeitas: Jean Charles; a morte muito suspeita (sozinho, em seu apartamento) do jornalista que denunciou Murdoch/The Sun, dias depois das denúncias; a tentativa de invasão da Embaixada Equatoriana, escamoteada depois de frustrada, e tantas outras.

O surgimento de uma carta, atribuída à suicida, reforça muito a hipótese de suicídio, mas precisa ser, OBRIGATORIAMENTE, submetida a uma perícia. A carta, conhecida por TESTAMENTO, atribuída a G. Vargas é, com certeza, uma fraude, mas seu suicídio indiscutível. Que a morte da enfermeira tenha se dado por esforcamento, também reforçaria a hipótese de suicídio, uma vez que é muito difícil um assassinato dessa forma. É bom não esquecer, entretanto, de que o nosso W. Herzog também foi apresentado como um suicida que teria se enforcado. Nesse caso, além de um exame minucioso do corpo e do local onde foi encontrado, é OBRIGATÓRIA A APRESENTAÇÃO DE UM EXAME TOXICOLÓGICO e a guarda de material para contra-prova. A partir de uma sedação, é muito fácil pendurar alguém em uma corda**.

Porque tenho fortes razões para desconfiar de que ela poderia ter sido simplesmente eliminada? Por toda a situação foi tratada como um SEGREDO DE ESTADOEliminação, é o que costumam fazer com pessoas que o aparato de ESTADO julga ser uma ameaça. Foi o que tentaram fazer com Jules Assange e o que estão fazendo com o oficial que teria lhe dado os telegramas do Pentágono. São mesmo muito ciosos em relação a acontecimentos que possam manchar a imagem do próprio aparelho de ESTADO. Nesses caso, entretanto, esse “esmero e cuidado” parecem em oposição aos interesses da sociedade. Ademais, especialmente nesses casos, deveria ser do interesse da própria polícia não deixar qualquer margem de dúvida. O que faz o MP inglês? Somente ele poderia ter independência em relação ao poder executivo que controla a polícia.

De uma coisa estou certo: há algo de muito podre—ainda escondido, mas querendo saltar à luz do sol—nos valores dos que detém o poder na Inglaterra. Juntem-se a isso os escândalos da BBC e seus apresentadores perversos e o quadro estará completo. A podridão, na terra de “Doctor Jekil and Mister Hide”, parece ter atingido níveis quase insanáveis…tudo sem perder a pompa e circunstância, é claro. Que, diante de um quadro desses, queiram culpar e destruir a vida de dois radialistas, é apenas a última indecência e hipocrisia. Devem ser apenas pouco responsáveis e levianos, como a carreira quase exige (com meu perdão aos mais sérios, pois eles existem). Pensam que toda a gente é inconsequente como eles. Não têm nenhuma idéia de que há pessoas que não se permitem certos erros e se transformam em juízes implacáveis de si mesmas.

Mesmo considerando que a morte tenha se devido a suicídio, a “culpa” deve ser procurada nas condutas de toda a sociedade inglesa e nos mistérios que cercam sua realeza. O mesmo é válido para as centenas de abusos contra crianças, cometidos por dois apresentadores da BBC, durante décadas. Quando essas situações envolvem centenas de pessoas e tudo continua encoberto, podemos afirmar, sem medo de errar: TODA A SOCIEDADE FOI CÚMPLICE, AINDA QUE NO SILÊNCIO. Atribuir esses fatos apenas a perversões individuais é cometer uma outra perversão.

Em certos aspectos, a Inglaterra parece estar ainda na “Era Vitoriana”. Em verdade, nunca fizeram verdadeiramente um levantamento crítico de todos os crimes associados àquela rainha e à sua corte. Apesar dos crimes hediondos cometidos no exterior, as primeiras vítimas do ambiente opressivo criado à sua volta foi o próprio povo inglês. Pensando bem, aliás, se ainda estivéssemos  na segunda metade do século XIX, sua corte teria apontado o dedo e gritado a qualquer empregado (a) que ferisse os segredos da Rainha: “Cut His (Her) Head off!”!

*Há que alertar que esses dados epidemiológicos não “protegem” ninguém contra o suicídio. Enquanto a epidemiologia lida com dados do passado e se refere apenas a populações e gruposde MAIOR risco, a clínica é individualizada e implica ação no presente, com francas consequências no futuro. Por isso, aqueles dados devem servir apenas como uma espécie de moldura que ajude a melhor observar um quadro, nunca o quadro em si.

**Sem querer sugerir nada a ninguém: uma sedação, com posterior enfaixamento da vítima e posterior enforcamento seria de muito difícil detecção. A polícia existe para desconfiar e não aceitar evidências muito fáceis e, com frequência, forjadas.

2 Comments

  1. Excelente artigo do Prof Márcio. De fato, em nenhum momento, a imprensa deixou entender que foram realizados os procedimentos periciais necessários para a elucidação do caso, ficando a notícia, mitificada, como uma súdita que se mata, envergonhada.

  2. Obrigado minha muito prezada Mônica!
    O silêncio da mídia, a respeito das situações que envolvem o aparato de Estado, é tanto que a gente fica pensando se essa omissão é “desinteressada”. Sóinvestigam o que lhes interessa?
    Preciso de alguns alentos de vez em quando. É bom não estar sozinho nessa desconfiança. É uma atitude de respeito para com as vítimas.

    Um abraço, Márcio

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