Arte e Cultura

MUNDO LÍQUIDO: PODER FEMININO e/ou MULHERES NO PODER

(Dos horrores que o “mundo duro” da indústria produziu..e há quem o chore!)

Márcio Amaral, vice-diretor IPUB

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“A crueldade que é praticada com crianças nas prisões inglesas é inacreditável…resultado de sistemas estereotipados, de REGRAS RÍGIDAS E IMUTÁVEIS …cada criança é confinada por 23 das 24 hs do dia. É estarrecedor….exemplo de como a imbecilidade pode ser cruel”. Oscar Wilde, 1897 (preso pelo “crime de homossexualidade”, em carta sobre a punição OFICIAL a um carcereiro que rompeu as regras da prisão ao dar biscoitos a uma criança encarcerada e esfomeada).

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NOTA: Sim! A Inglaterra foi não somente o berço da REV. INDUSTRIAL como também das torturas institucionalizadas e tornadas oficiais a partir de regras duras: divulgadas, consideradas “naturais” e amplamente aceitas. Assim, quando Z. BAUMAN faz um elogio daquele final de século; do seu “otimismo generalizado”, etc., revela uma infantilidade inaceitável em um pensador. Depois do colapso de suas crenças “stalinistas”, “exilou-se” na Inglaterra, adulou aqueles que atacara e conseguiu ocupar algum espaço na mídia.

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Está na moda falar mal das novas gerações e dos caminhos que a humanidade estaria seguindo. A rigor, sempre esteve; é tema recorrente entre decadentes de todas as gerações. Sempre que escuto  algo do gênero, especialmente vindo de pessoas mais velhas, pergunto: se o mundo que você “recebeu” era muito melhor do que aquele que “entregou”, então, de quem é a maior responsabilidade? Entretanto, se naquela denominação do mundo (por Bauman proposta) havia algo um tanto pejorativo, o resultado terminou por ser muito interessante. Afinal,“água mole em pedra dura…”. Quem sabe não está indicando uma mudança profunda nas relações sociais? Talvez implicando, como já disse em texto anterior, um COLAPSO DO PODER MASCULINO nas sociedades em geral*. É o que sinto no ar. Considerando a qualidade das relações humanas na nossa sociedade, uma mudança fundamental seria motivo de esperança. Por enquanto, esse colapso parece ser apenas moral e ideológico, não tanto na concretude e dureza das relações sociais…mas é assim que as grandes REVOLUÇÕES se iniciam: uma pequena onda…crescendo em MARÉ MONTANTE até tudo arrastar à sua volta. Uma das maiores queixas de Bauman é a rapidez com que as novidades vão se dando, sem dar tempo para que algum teórico as englobem em todo qualquer. Quanto artifício! Quer tudo “lento, gradual e seguro”. Talvez o mundo esteja atropelando as “mentiras lógicas” com que os teóricos costumam brindar a sociedade, atrapalhando a evolução das coisas. Alguma teoria mais confiável há de brotar no processo.

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INDÚSTRIA: AUGE DA DUREZA E PODER  MASCULINO

O período mais exaltado pelo autor é exatamente aquele que significou o auge do MUNDO DURO, final do século XIX com o “império da indústria” pairando sobre todas as cabeças. Só um tolo pode imaginar que as mentes humanas ficariam imunes àquelas transformações! Em vez da humanidade “cavalgar” aquela sua grande aquisição, viu todas as suas relações serem por ela devoradas. Ninguém o demonstrou tão bem quanto C. Chaplin em “TEMPOS MODERNOS”! O que vou tentar dizer aqui está lá expressado de maneira muito mais lírica e candente: as pessoas foram transformadas em peças de uma engrenagem…e até sua matéria prima a consumir. E qual o resultado daquela evolução tão drástica? O choque de todos IMPÉRIOS: na Primeira G. Guerra e sua continuação depois de alguns anos de intervalo; o tratamento das pessoas como descartáveis, chegando ao ponto dos seus corpos serem tratados como INSUMO para aquelas mesmas máquinas. Sob o império do MECANISMO não havia muito espaço para humanidades. Os “bonequinhos mecânicos e apressados”, capturados pelas lentes do cinema nascente dão a dimensão do quanto TODOS (ou quase) eram controlados a partir de fora e por forças totalmente desumanas. Não há nada a lamentar no “enterro” daquele mundo! Nada há de ser pior. Bem vindo o FIM do MUNDO DURO, ainda que corramos o risco de nos afogar no que virá!

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TODA BESTA É MAIS PERIGOSA NOS SEUS ESTERTORES

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“A AMÉRICA nunca deixará de ser a nação mais poderosa entre todas!” (TRUMP, diante da agudização da crise com a C. do Norte. Os imperadores romanos certamente disseram o mesmo em algum momento).

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Alguns poderiam argumentar: “Mas se o mundo duro—caracterizado pela virilidade falsa e desviada de foco—está entrando em colapso, como se explicam fenômenos como TRUMP, PUTIN e ainda o todo poderoso ERDOGAN (Turquia)?”. No eterno choque entre contrários—da implacável DIALÉTICA e suas contradições—é comum que, diante da intuição de sua própria morte, as “BESTAS” de longa presença entrem em desespero e tentem aprofundar a perversão da sua expressão. Podem dar a impressão de mais força, mas estão apenas atirando para todos os lados tentando se reafirmar destruindo as forças contrárias que sentem crescer inevitavelmente. Quando do final da I. Média, diante a crescente influência da figura de MARIA** (associada à tolerância, perdão e acolhimento), as perseguições religiosas atingiram seu auge: nunca tantos foram mandados às fogueiras e masmorras. Lutero e a REFORMA são uma consequência dessa luta contra as mudanças sob inspiração feminina tão evidente na arte RENASCENTISTA. A exemplo do que se passa hoje, o que estava em jogo era também uma elevação do poder feminino. E eis que as religiões se tornaram, mais uma vez, instrumento nessa luta ideológica: enquanto o PAPA tudo aposta na procura da dimensão humana, todos os fundamentalistas anti humanos (inclusive católicos, especialmente das igrejas dos EUA) se reúnem em uma mesma trincheira.

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QUE VENHAM AS MULHERES…MAS COM VALORES FEMININOS!

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Como disse no outro texto, é um erro associar diretamente mulheres no poder com poder feminino. Muitas terminam por se tornar arautos do que há de pior no poder dito masculino: M. Thatcher e Isabel de Castela são dois exemplos. O contrário também é verdadeiro, como se pode ver no exercício de J. Troudeau (Can). A rigor, diria que o único poder social que deve interessar é o de inspiração feminina. Que os homens, eventualmente no seu exercício, vivam em sua função. Era assim nas sociedades anteriores à agricultura, com as suas GENS de linhagem FEMININA sendo a maior referência da sociedade (ver Morgan e Engels: Origem da Família, da Propriedade Privada e do Estado”). Continua a ser assim entre os nossos muito próximos bonobos e gorilas. Esses, alardeiam sua força batendo no peito…para outros machos; exibem suas belas costas prateadas e sua cabeça avantajada, mas só exercem poder enquanto são autorizados pelas fêmeas. E como são por elas conduzidos no dia a dia! Sua função maior (além da reprodução, é claro)? Dirimir conflitos entre os membros mais jovens do grupo…e, nesses casos, não me venham falar de família, essa invenção totalmente MASCULINA voltada contra o poder feminino. Em termos humanos, quem conhece bem a Suécia e o funcionamento de sua sociedade sabe que, à sua maneira, as mulheres estão na condução da maioria dos ambientes, mais ou menos discretamente. O resultado? Uma sociedade bem mais acolhedora***. Há por lá, sim, muitos homens e mulheres que estão incomodados, por ex., com o número de imigrantes que por se podem ver pelas ruas. Mas se limitam a um olho mau eventual. Mas até esses precisam ser ouvidos, compreendidos e… acolhidos.

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*Essa associação me veio a partir de uma turma da PSICOLOGIA-UFF. Havia, é claro, uma predominância de mulheres e por mais que eu a tentasse “pegar”: questionando, estimulando contestações, etc., não avançava muito. Veio a prova e o resultado foi MUITO BOM. Pensei “Agora vai…”. Continuou a mesma coisa: com atrasos e aparente frouxidão. Veio a segunda prova e o resultado foi MELHOR AINDA. Então pensei: “Essa turma parece líquida!”. Estavam resistindo ao meu poder. A associação com Bauman foi imediata.

**A exemplo do que fazem certos (im)p@stores brasileiros ditos evangélicos, os luteranos da época chutavam imagens de MARIA e a usavam como alvo em exercícios tiro (ver “Crônicas do Reinado de Carlos IX”, P. Merrimée)
***Por lá imperam: regras muito boas e adaptáveis às necessidades humanas.

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