Arte e Cultura

REITORIA: UMA BELA POSSE E ALGUMAS CONTRADIÇÕES!

(Um discurso “quase plataforma” para unir todas as Universidades Públicas)

Márcio Amaral

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leher 1NOTA: no que se refere à luta política, estou como que “condenado” ao isolamento. Não tenho observado uma boa convivência com a crítica por parte das pessoas nela envolvidas. Como não posso abrir mão daquilo que considero o que tenho de mais pessoal e importante, o que me resta é levar o traço às suas últimas instâncias, se possível apreciando os resultados. Participei ativamente da eleição de Leher e confio muito nos seus propósitos e práticas, mas o “caldo entornou” muito cedo nas relações com boa parte daqueles que hoje participam da administração direta da UFRJ. O que vai abaixo é a minha contribuição para tentar AREJAR a discussão e (quem sabe?) alguns espíritos*.

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A sentença de Nelson Rodrigues: “Toda unanimidade é burra”, está longe de ser uma lei. Quando muito…uma regra. E se há pelo menos uma exceção para ela, pudemos constatar através das reações ao discurso de posse do novo Reitor da UFRJ, Professor Roberto Leher. Bem…ele já trazia “PROFESSOR” no próprio nome, mas está longe de ter a pose de um “HERR PROFESSOR”. Sim, em tempos de grandes dúvidas e quando nossa cultura sofre ataques por todos os lados, eu diria: foi uma posse com os melhores ingredientes da brasilidade**! Alguma pompa? Somente a inevitável nessas circunstâncias e nunca a ponto de toldar a espontaneidade e a dimensão humana do acontecimento. Quando da campanha eleitoral, ouvi de pessoas muito presas ao cerimonial: “Leher nunca vai ter uma atitude de Reitor”! Eu, que não aprecio muito as “amarras cerimoniais” (acho que nelas não caibo), disse haver nisso uma total inversão de valores. Sim! Há aquele mínimo de cerimonial e formalidade a que se deve obrigar um Reitor. Mas, a exemplo das grandes obras musicais—sem as DISSONÂNCIAS, todas seriam insossas e sem graça—, sua quebra, sutil e bem humorada, pode conferir mais beleza ainda às situações aparentemente muito formais.

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leher IINão vou citar as teses principais do discurso, pois ele está disponível na Internet. Uma coisa é certa, porém: em tempos de ataques cerrados e permanentes à UNIVERSIDADE PÚBLICA brasileira, pode representar uma espécie de plataforma em sua defesa e haverá de sensibilizar a todos os Reitores de boa vontade pelo Brasil afora***. Qual deles pode estar insensível às humilhações por que todos (mais ou menos) têm passado em suas gestões, a partir do desrespeito com que todos temos sido tratados? Até mesmo aqueles poucos que, seja por “carreirismo” ou outros interesses inconfessáveis, apoiaram (quase incondicionalmente) o governo em suas investidas INCONSTITUCIONAIS contra a nossa AUTONOMIA, devem estar se perguntando que caminhos tomarão em uma situação tão difícil e confusa. Agora, e diante dos novos fatos, não têm mais a desculpa para dizer: “Não há outros caminhos…Não tem Plano B…”, e outras coisas que nos envergonham. Até para esses, o melhor há de ser sempre o RESGATE DOS PRINCÍPIOS como uma espécie de bússola para as condutas futuras. Pois foi isso o apresentado por Leher em seu discurso de posse. Aproveitem colegas! Ainda há tempo de salvar suas Universidades e seus próprios nomes!

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Mas nem tudo são flores, é claro! Muitos daqueles que compuseram e apoiaram a Chapa 20 (fazendo, ou não, parte de sua administração direta) parecem não ter compreendido que as eleições já foram vencidas e que o momento é de procurar—não por “unidades”, pois elas costumam ser hipócritas—por atitudes, gestos e teses que impliquem a mensagem: há espaço para todas as formas honestas de abordar nossa atividade e o papel social das universidades. Haverá de ser através dos choques leais de opinião que avançaremos e nunca no sentido que cada um gostaria. Ninguém há de fazer uma UFRJ “à sua própria imagem e semelhança”. O convite para a posse, por exemplo, vinha com os dizeres: “POSSE DA CHAPA 20 na REITORIA DA UFRJ!”. E eu pensei: “Como assim? Quem está tomando posse é ‘apenas’ uma nova ADMINISTRAÇÃO e espero que seja voltada a toda a comunidade acadêmica!”. Convenhamos: isso é muito diferente de uma “chapa” que existe, por definição, “apenas” para apresentar à comunidade uma proposta. Sim! Aquela “Chapa”, e o movimento que a gerou, hão de ficar na história, de cada um e da UFRJ. Mas agora é passado.

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Mais preocupante ainda foi o texto do convite apresentado como “manifesto ufrj”

“Temos certeza de que a posse será o primeiro dia da construção de uma UFRJ autônoma, crítica e democrática, obra que faremos a muitas mãos…”.

reitora unifespQuem lê aquele “primeiro dia” (caso não tenha informações a respeito) deve pensar ter havido uma “Revolução”, grave ruptura ou uma espécie de “corte epistemológico” durante o processo. É bom lembrar que: 1-houve uma eleição; 2- foi seguido e respeitado por todos um amplo debate de ideias; 3- a eleição se deu de acordo com um modelo discutível, mas aceito por todos e que permitiu a expressão e imposição de amplas maiorias sem maiores traumas; 4- que o espírito democrático perpassa, há muitas décadas, a UFRJ (apresentando uma continuidade desde a gestão de Aloísio, pelo menos). Ou seja: a gestão LEHER representa, sim, um salto de qualidade(independentemente de ser melhor ou pior, pois está apenas começando) em relação ao que havia, mas está longe de ser um CORTE ou RUPTURA com toda a nossa história. Não deverá resultar dali, apesar de sua enorme importância, um espécie de AC/DC (ou AL/DL).

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reitor pucE qual foi uma das teses mais pregnantes da primeira parte do discurso de posse? Um reconhecimento da conduta republicana e democrática dos membros da gestão que terminava, especialmente do Reitor e daquela que foi sua candidata à sucessão. Frases como: “Essa TRANSIÇÃO para uma perspectiva nova”“Não podemos deixar que retrocedam os esforços de várias gerações”“Essa bela história que estamos construindo…”, eram apenas o registro em palavras do clima que cercou toda a cerimônia. Houve também momentos da mais plena intuição, que não tem falhado ao novo Reitor. Ele ficou verdadeiramente honrado ao receber o boné do MST, afinal, o que mais defende é nossa aproximação da gente simples de nosso povo. Levantou-o nas mãos, exibiu-o orgulhoso, mas não o pôs na cabeça. Dias antes, ele também me pareceu ter “ouvido” sua intuição e votou (no CONSUNI) contra a suspensão do calendário acadêmico, uma vez que os professores não tinham ainda aprovado a entrada em greve. E como foi criticado entre os que o tinham apoiado! Há que entender e aplicar, nesses casos, um bom PRINCÍPIO: aqueles que assumirão SOCIALMENTE (e em todas as instâncias) as responsabilidades por todas as decisões da Reitoria, tem também o DIREITO e obrigação de dar uma resposta final quando das decisões.

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*Muitos sequer entenderam que minhas críticas em relação à deflagração da greve (em curso) fora aos meios usados para sua decisão. Quando soube, dias antes da assembleia seguinte (confirmando a decisão de permanecer em greve, por diferença de 10 votos), que os “derrotados” proporiam sua suspensão, enviei-lhes mensagem (temos amigos em comum) sugerindo que não o fizessem. Seria muito mal entendida, dando a impressão de mera “revanche” e um desgaste desnecessário. Muita gente não entende que, na luta política, tudo pode mudar muito rapidamente. O lado bom do acontecimento foi a negativa UNIFICADA ao estabelecimento de negociações a partir da proposta governamental.
**Há que assinalar: o fenômeno “eleição de Leher” (e até o seu discurso de posse) é consequência de um grande movimento de resgate de valores que empolgou a UFRJ como poucas vezes em sua história.

***Por isso mesmo, dizer que a UFRJ deve ter um tratamento especial por parte do governo (trecho de um outro discurso na posse) me parece altamente contraproducente. Não queremos privilégio! Em verdade, lutamos contra eles. Se nossos pares nos atribuírem algum papel especial nesse processo, ficaremos orgulhosos. É bom lembrar que, na plateia, encontrava-se a Reitora da UNIFESP, Prof Soraya Soubhi Samili, e isso nos deixou muito honrados. O que dizer, ainda, da presença do Reitor da PUC, Prof. Pe Josafá Carlos de Siqueira? Em “tempos de Francisco”, isso pode ter muito significado!

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