Arte e Cultura

UPPs SOB ATAQUES! PERDENDO O APOIO POPULAR!

(Consequência natural do clima de guerra contra a gente mais simples do povo)

Márcio Amaral

…………………………………..

unnamedQue era necessária uma ação pública para garantir o acesso do poder público a todos os recantos do país—não respeitando qualquer bloqueio por parte de qualquer grupo—de maneira a garantir os direitos dos moradores de todas essas regiões e melhorar suas condições de vida, ninguém duvida. Por isso, as UPPs foram saudadas como um início de um processo. Muita gente deve até ter acreditado que, finalmente, os lamentos do morro tinham sido ouvidos na cidade: “Vai barracão/Pendurado no morro/E pedindo socorro/À cidade a seus pés…” (L. Antonio e O. Magalhães). Outros de seus moradores, mais desconfiados e “escolados” na herança escravagista, viram naquilo apenas mais um instrumento de opressão contra os moradores dos locais que seriam “ocupados”. O uso desta palavra, aliás, apontava nesse sentido. Agora, todos estão concluindo que foi mesmo perdida a dimensão do interesse do próprios moradores dos locais. Tudo parece estar apenas a serviço dos interesses da “gente do asfalto”, ainda que esses interesses sejam, eventualmente, contrários aos dos moradores dos morros “ocupados”. Assim, o ambiente está se deteriorando rapidamente e, de novo, os responsáveis pelo processo pediram apoio às tropas federais. Tudo em decorrência da completa desmoralização da PM.

…………………………………….

Para os que se surpreenderam com os tiros dirigidos contra uma família sentada nos muros e calçadas próximas à sua casa, levando à morte uma mãe que deve ter ficado para trás com a intenção de proteger filhos e sobrinhos (adotados), basta que se lembrem das cenas de aldeias vietnamitas ou de casas iraquianas tomadas por soldados americanos: FOI TRATAMENTO DADO ÀGENTE DO LUGAR, POR UMA TROPA INIMIGA. A forma como se deu o recolhimento do corpo e o ato quase final da barbárie que se instalou…apenas consequências do clima criado. Como disse o marido da Senhora Cláudia: “Se não fosse a abertura da caçamba; o arrastar do corpo e a filmagem, a morte de Cláudia teria sido apenas mais um caso”. Louvemos a pessoa (esse brasileiro) que, diante da catástrofe pessoal; da adulação de autoridades hipócritas e das promessas de “indenizações”, conseguiu manter o compromisso com toda a gente simples do país ao ampliar a questão, dando-lhe a dimensão que tem. A militarização das polícias, aliás, IMPLICA um viés de classe e visa PRINCIPALMENTE a proteção dos interesses das pessoas mais abastadas, contra a gente mais pobre. Está no DNA dessa militarização. Nada mais natural do que a ocorrência de uma revolta popular.

………………………………………………….

Querem uma  demonstração de que se criou, na PM, esse clima contra os mais pobres e que as autoridades do Governo do Estado são as maiores responsáveis por isso? 1- Quando o BOPE ocupou o “Alemão”, fez uma cerimônia que mais se pareceu com a ocupação do “Reichtag” pelos russos—só que o “Alemão”, no caso, era muito brasileiro—ou da ilha de Guadalcanal pelos americanos na guerra do Pacífico (tudo bem cafona, é verdade). Houve até um ridículo hasteamento de bandeiras (brasileira e do BOPE, aquela da caveira, que deveria fazer envergonhar qualquer autoridade), não me lembro se com banda de música. Tudo como se um terreno inimigo tivesse sido conquistado*. Devagar com o andor!; 2-Com uma frequência preocupante, e de maneira irresponsável, essas autoridades se valem da palavra GUERRA: “contra o tráfico”; “civil” e “pela segurança”, guerra disso e daquilo, esquecendo-se de que, durante guerras, são suspensos os direitos civis e que essa palavra funciona como uma senha para justificar tratar os outros como inimigos. A própria população dos morros é tratada como inimigos a derrotar. Estava dada a senha para as revoltas! Elas já começaram. A crise está estabelecida. Acabou a credibilidade. Sempre pode ser recuperada.

……………………………………………………..

AFASTARAM O BOPE DA MARÉ? BOM SINAL!

……………………………………………………..

Agora, logo depois da morte de uma PM na Rocinha, houve uma reocupação dos morros pelo BOPE e sem data para terminar. Algumas semanas antes, a Major Priscilla (como foi noticiado) proibira “bailes Funk”** por lá, e as pessoas—jornalistas inclusive—não conseguiram estabelecer relação entre os fatos. A ditadura não provocou emburrecimento generalizado na imprensa, mas o poder e o medo em relação aos seus patrões (na GMíd) está tornando os jornalistas pessoas muito dóceis e sem imaginação! Tratando a comunidade do morro como se vivesse em um colégio interno, não há como convencer as pessoas que lá vivem de que a acupação é em função dos seus interesses. Com isso, essas autoridades se arriscam a transformar os traficantes em heróis. Agora, o risco maior é de que até as tropas do Exército percam credibilidade, uma vez que a presteza da sua intervenção na Maré sugeriu que agem em função da COPA*** (Aliás, essa Copa é para quem? Parece ser contra o Brasil e seu povo). Eu prefiro imaginar que os governos perderam a confiança no BOPE, até pela sua ação desastrada que deixou dez mortos por lá. É bom lembrar que, também por ali, expressou-se pela primeira vez uma união das comunidades com outros grupos interessados em direitos humanos e civis da sociedade, fato que se repetiu quando do sumiço de Amarildo.

………………………………………

Nossas apodrecidas autoridades não sabem o risco que estão correndo! Há muito tempo, digo que a maior garantia de segurança pessoal para os policiais deriva do seu próprio respeito às leis. Por mais cruel que seja um criminoso, costuma ser sensível a um certo código de justiça implicando reconhecer o dever (e o “direito”) de um policial de cumprir a lei. Se os PMs respeitam as leis, tendem a ser respeitados até pelos criminosos. O clima de barbárie aplicado pela polícia tira a segurança da própria polícia. Agora, entretanto, vejo riscos mais graves no horizonte. Criado o clima de guerra, pergunto: e se os criminosos das zonas “ocupadas” (volto a dizer, como se fosse uma guerra) resolverem se tornar “snipers” (atiradores de elite)? Quem poderá impedi-los de matar um número cada vez maior de PMs à distância de alguns Kms? O posicionamento para esse tipo de tiro é individual e se faz em uma madrugada. Em Stalingrado foi muito usado por russos contra os alemães. Quando é que nossas autoridades vão entender que questões sociais não se resolvem pela violência e que o recurso a ela deve ser uma exceção a evitar?

……………………………………………

*Repetiram o mesmo ritual na Maré, agora sem as caveiras! Que as Associações de moradores somente aceitem esse tipo de ritual se ele for aplicado em todos os bairros do Rio! Além disso, aprendi que, sempre que haja uma bandeira qualquer, a do Brasil tem que estar acima dela, caso contrário seria sedição. As bandeiras do Estado e da Nação estão na mesma altura na Maré…quer dizer, aparentemente.

**É bom não esquecer que o samba já foi proibido e muito perseguido até bem adiante no século XX! O “Funk” é a voz da nossa época nos morros e, por isso mesmo uma expressão cultural muito importante. Achar que o morro vai continuar a cantar com Tom jobim o seu belo “O morro não tem vez…” é de um anacronismo sem par. O morro exigiu a “sua vez”, e sem suavidade. Considerando que a cultura é o único (ou o melhor) meio pelo qual os povos (os seres humanos em geral) e as classes sociais podem se aproximar, quem atacar essas expressões está condenado à derrota. Triste foi ver uma mulher ser identificada com aquela atitude e “pagando” toda a conta pelo fracasso de uma política.

***No anúncio das novas UPPs da Maré, Cabral e Beltrame se traíram em suas falas. Cabral deu um peso enorme no fato de se “tratar de um zona estratégica”, próxima às grandes vias de acesso à cidade e ao Aeroporto, o que caracteriza a “ocupação” como um ato contra o povo da região. Já Beltrame perdeu completamente a postura de um homem público. Disse que sempre que o tráfico enfrentar as forças da ordem, eles responderão com mais UPPs,“mostrando que somos mais fortes”. É a isso o que se chama “ser pautado” pelos criminosos.

……………………………………………………

NOTA: a canção abaixo foi inspirada pela invasão da Maré que levou à morte dez de seus moradores, muitos sem nenhuma passagem pela polícia.

TSUNAMI NA MARÉ

Márcio Amaral

….

Tá subindo uma onda,
E invadindo a Maré.
Quem puder que se esconda,
Ou junte as tralhas e dê no pé.

…..

(Mas) É uma onda muito estranha,
Tem coturno bala e cacetete,
Que a toda gente abocanha
E quer mascar feito chiclete.

…..

Quem mandô ‘tar no caminho
Que vai direto ao aeroporto?
Eles não gostam do vizinho
Querem tudo seco…tudo morto.

….

Mas agora nosso povo
Não tá se sentindo tão sozinho.
Na cidade tudo é novo,
Mudou da água para o vinho.

……

Tem uma garotada boa
Que veio se juntar à gente, (AH!!!)
E como uma coisa à toa
Torna tudo diferente.
E Prás maroninhas do Beltrame
Levantaram uma Tsunami!

Mas se tudo der errado,
A gente já sabe o que fazer.
Por mais cruel que seja o Estado
A gente insiste em aqui viver.

…….

E se os homê vier e rapa tudo….
Já aprendemo com o amigo caranguejo:
A gente se enfia lá no fundo,
Trança as pernas e troca beijo.

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *